O POETA À CONQUISTA DO MUNDO - Oito Sonetos
«O SONETO REVISITADO»
I – DIAGNÓSTICO Palavras e palavras, vagas de palavras Enredam e obscurecem o genuíno mundo Que ano após ano agravam o seu mal profundo Tornando as almas puras em servis escravas. É inútil recordar as intempéries bravas Que ameaçam torná-lo ainda mais imundo Cavando à sua roda um abismo sem fundo De infaustas sombras e de esperanças cavas. É urgente e é a hora, sem tirar nem pôr, De um aprontamento, em coração-magia, Que lavre a terra com palavras de Poesia Vestidas de paixão, de sonho e de vigor. Sabemos, todavia, qu´ é dura esta Viagem “Muitos são os chamados, poucos os escolhidos” E também muitos os segredos escondidos P´ lo que se impõe a ousadia e a coragem. O mundo-Éden transformou-se em aridez E os chacais sobrevivem por aí a esmo Importa, outrossim, reconquistá-lo mesmo À sombra poética da humana honradez! II - “A Revolta do Soneto” Quando nasci eu tinha só dois ou três versos E toda a gente me cantava por lazer. Agora que cresci, em tempos controversos, Quero abrir novos horizontes de prazer. Toda a arte das Letras comporta diversos Estilos, como formas poéticas a haver, E entre elas eu, Soneto, os ideais perversos Pretendo restaurar nas formas de escrever. Eu quero ser sonoridade, ritmo e canto; Eu quero ser musicalidade e emoção; Eu quero ser elegância, rosto e encanto; Eu quero ser imagem, luz e perfeição. Catorze versos, podem-me dizer porquê? Por isso eu, Soneto, venho proclamar Convicto de que até um pobre cego vê: Abaixo as vis algemas. Deixem-me inovar! E, acima de tudo, co´ a devida propriedade Sem melindrar os diferentes argumentos E à luz dos mais apaixonados sentimentos Desfraldo, aqui, a bandeira da Liberdade! III – Mar Bravio Eia, às armas! Mas onde é que estão as armas? Nos navios que partiram, de Argos, de Jasão, No velo de ouro defendido pelo dragão Urgindo arrostar num mar de vivas calmas? Eia, ó espadas! Mas onde é que estais espadas? Nos bravos esquadrões de Coração-de-Leão, Naquele Graal sagrado de Excalibur na mão Urgindo cavalgar no dorso d´ éguas aladas? Ó mar bravio, ó armas, ó espadas, valentias Que afrontais um combate de aguerridas fúrias, Abandonai de vez vossas tristes lamúrias E trazei até mim mais versos e poesias. Velo de ouro, graal sagrado, meus dilemas E dentro deles, porém, um coração bravio, Quero fazer de vós o mais nobre desafio E que esta espada-pena escreva bons poemas. E se para tanto eu não tiver engenho e arte E não puder cantar o meu discreto fado Trazei-me, ó Musas, um talento renovado Pra fazer da Poesia um eterno baluarte! IV – Dos Inimigos Onde é que estão os teus inimigos, ó Poesia? Onde é que está a máscara da tua inconstância, E onde se esconde a razão da tua ignorância: Nas cavas emoções dum´ alma em fantasia? Teus inimigos são horrores de ventania, Que sopram pelas brechas desta minha errância, Triturando, nos mares da dura militância, O ignóbil Adamastor da loucura e d´ apatia. Teus inimigos, senhores da abjecta guerra, Nunca hesitam em incendiar pela violência E tenaz raiva contra a cultura e a decência, Favorecendo o miserabilismo desta terra… Há ventos de ódio, de invejas e alçapões, Há armadilhas traiçoeiras e repelentes, Que não s´ inibem de coroar as suas mentes De versos engendrados pelos vendilhões. Ó casta e inocente Poesia, que vagueias Desde há muito pelos inóspitos desertos, Não te deleites p´ las lentilhas dos espertos E colhe decidida os frutos que semeias! V – Dos Factos Se um verso, quando só, azeda muita gente Mais que um verso, por certo, azeda muito mais; E se uma quadra, para alguém, já é demais Que fará um poema qu´ o é mais abrangente? Se um só “soneto acrescentado” é delinquente Por ter catorze versos ou um pouco mais; E se houver outros poemas ditos “informais” Rasgam-se impropérios à poesia repelente… Se um epigrama ou uma ode já é uma seca E uma perda de tempo, além dum desconcerto; Que fará uma elegia ou qualquer excerto Que conduza a Epopeia entre Seca e Meca? Se um verso é solto ou branco – o que tanto faz – Ou s´ é um dístico ou trístico, ou sei lá o quê; Que fará um haicai, que em poema se não revê, Crescendo ao deus d´ Ará rebelde e contumaz… Poeta que te crês, vai por aí de rua em rua, Leva a tua bandeira, leva o teu troféu; Percorre todo esse mundo, desde a terra ao céu, E terás, como triunfo, a «glória» sempre tua! VI – O Solar de Amores Depois do bom combate é a hora do descanso: Curar feridas é uma tarefa crucial, Harmonizar as emoções é fundamental Retemperando forças em edílico remanso. Depois do bom combate há que fazer balanço Num equilíbrio justo entre o bem e o mal; Limpar a alma de algum erro acidental E reparar o espírito de lanço em lanço… Despido o bom herói de todas estas dores, Curadas as esperas, agrestes e confusas, P´ la convivência pura co´ as divinas Musas, Ouvir-se-ão cânticos neste Solar d´ Amores. À conquista do mundo com poesia nova, Aquela Poesia repleta de esperança Num horizonte de liberdade e confiança, Eis o maior prazer e gozo a toda a prova. Calem-se de Virgílio – os seus poemas sãos – De Dante e de Camões e tudo o que deixaram; E, porque outros ditosos cantos se recriaram… Eia, ó Poeta, o Mundo está em tuas mãos! VII – O Legado Descansa, poeta, e põe a tua Lira a cantar Dando, a cada hora, testemunho de se ver… Arando a terra co´ o talento de enaltecer Para qu´ teu nobre Sonho possa germinar. O húmus que lançaste permite acreditar Que puros são os grãos que te irão satisfazer P´ los frutos promissores que hás-de recolher Numa obra meritória digna de encantar. Do alto do Parnaso as Musas cantarão Sendo belas as harmonias que criaste E tu, poeta, que no teu estro acreditaste, Terás o maior gáudio p´ la tua criação. E o divino Apolo, que sempre te honrou Co´ as bênçãos protectoras que ora lhe pediste, Deixar-te-á feliz no caminho que seguiste Cantando este teu Canto qu´ o apaixonou. O Mundo é belo e, nele, é bela a Natureza E são belos os versos, na Poesia qu´ ela tem, E abençoados os Poetas, mais que ninguém P´ la Obra que deixaram repleta de Beleza! VIII - Epílogo “Se não fora a Poesia olhando a História, nenhuma vida em verdade conheceríamos, nem a nossa própria.” Jorge de Sena O Mundo das Letras, e da Poesia em particular, Olhando estão para a Missão providencial Que todo o Poeta, pelo seu agir essencial, Tem entre mãos uma Solução a palpitar… É acender uma Luz que possa iluminar, E reforçar, aquela esperança consensual Pela qual as Novas Artes, de forma natural, Façam da fiel Cultura fermento a levedar. Há que repensar, pois, com toda a fidelidade Os parâmetros que importa hierarquizar E o sentido que eles devem implementar Salvaguardando a preservação da Liberdade. Destarte, é na Poesia – liberta de todo o estigma – Que se encontra, afinal o desejável condimento Capaz de revelar o humano encantamento Que leve toda a ARTE a ter uma Face digna. Travada esta Batalha, com Alma de aventura Feita da própria vida em cada madrugada, Terá o Poeta, finalmente, consagrada A glória da Paixão coroada de ternura! F I M Frassino Machado In AS MINHAS ANDANÇAS
FRASSINO MACHADO
Enviado por FRASSINO MACHADO em 25/10/2020
Alterado em 26/10/2020 |