ODE DO DISCURSO VADIO
Andam as palavras feitas vadias
Por aqui e por ali De rua em rua De praça em praça De beco em beco De porta em porta. Que procuram elas afinal Neste discurso sem eira nem beira? O que é que havia de ser? O seu sentido original e transparente… E entende-se esta demanda. Esquecem-se elas mesmas, todavia, Que lhes pertence por função Dar sentido à linguagem. Mas não dão ou não quererão dar? A sua deriva vai dolorosa, Vai indecisa e duvidosa, Por nevoentos meandros sem saída. Às palavras assim perdidas, Às palavras assim redias Despidas de identidade, Ainda lhes chamam discurso E, ou então, meta-literatura… Pois … do outro lado da barricada Os agentes vadios são, porém, Não mais que traficantes de letras: Ai dos escritores, ai dos poetas, Ai dos trovadores descoloridos À espera que da esfera dos acordos, Que não são nem carne nem peixe, Venha algo de bom a anunciar… … A linguagem, ingénua, pagará por tabela Esta absurda teatralidade. Ó Discurso Literário vadio, Ó arte e carisma da Palavra, Que sendas enviesadas transitais, Que encruzilhadas, que sentido? Qual é o vosso horizonte? Afinal … Sois educação, sois escola, Sois panaceia, maledicência, Interesseirice ou negócio? Eu sei. Por mais que digais que não Vós, Palavras, de Discurso mascaradas, Sois instrumentos banais, Sois armas desconhecidas Nas mãos de incautos actores E de ocasionais oportunistas E então … Ai das vítimas! Entendamo-nos, ó Palavras, Que opções no vosso discurso? Quereis ser máscara contínua, Quereis ser política insana, Quereis ser patacas e refugo De crianças adultas, Ou adultos-criança Que usam de birras como feitio? Ó Poesia, ó filosofia amorfa De literatura vazia e, ou, anestesiada Por vitualhas e mezinhas, Quiçá envenenadas… Ó Prosa feita poesia esfrangalhada Ou fragmentada dando a entender O fugaz combóio da pós-Arte… Ó Música – da Poesia irmã – Como reagirá a tua honra e brio Perante a falsa transumância Das quotidianas palavras Prenhes hoje da perene saudade Da tua confidência? E tu, ó Lira, que lhes tocaste em sorte, Estarás certamente agrilhoada E resistindo à incúria do Tempo. Eis, ó Palavras e ó Discurso, O vosso estatuto: Ou sois tudo ou sois nada! Frassino Machado In RODA-VIVA POESIA
FRASSINO MACHADO
Enviado por FRASSINO MACHADO em 13/01/2017
Alterado em 13/01/2017 |