PÓS-MODERNISMO E RESISTÊNCIA - III
Réplica a Mª João Sousa - Frassino Machado
O seu artigo é muitíssimo bom, Frassino Machado! Subscrevo-o quase integralmente. Este "quase" fica aplica-se àquele ligeiro desprezo que me parece transparecer no que toca à produção poética modernista... é que mesmo considerando-a uma poesia que exige um enorme talento a quem nela se aventura, apaixono-me facilmente por alguns poemas desta linha... estou-lhe a responder com o coração nas mãos. É um tipo de poesia que, quando boa, mesmo muito boa, me apaixona muitíssimo... e eu cresci rodeada de modernistas... talvez seja essa uma das razões que me levam a ser-lhe simultaneamente tão crítica - por muito que me cale - e tão apaixonadamente devota... provavelmente perguntar-me-á porque razão tenho tão pouca produção nessa linha e tanta, tanta, na do soneto e redondilhas... e eu não lhe saberei responder com grande objectividade porque escrevo sempre a partir de uma compulsão e a forma define-se conforme o poema me vai surgindo... o que é certo é que é em soneto (e agora também em décimas) que ele me surge quase sempre... um fraterno abraço, meu amigo! Maria João Sousa, poetisa Fiquei grato pelo rico e elucidativo comentário com que me presenteou, caríssima poetisa amiga. Desde já, bem-haja pela sua prontidão e mestria no que diz respeito ao conteúdo e sequência do seu discurso. É com todo o prazer e discernimento que passo a elaborar a minha resposta. Em primeiro lugar agradeço, estimada amiga, o elogio que me fez. Confiava no seu veredicto mas, pode crer, parece-me que neste pormenor foi um nada “mãos largas”. Em segundo lugar queria, para já, chamar-lhe a atenção para o título do artigo: «pós-modernismo e resistência»! Eu não estou a falar de Modernismo (1ª metade do século transacto) mas, sim, de “pós-modernismo” (último quartel do mesmo século e… até à actualidade). Trata-se, pois do “status quo” contemporâneo, quer dizer, a seguir à geração que nos formou e que nos deu asas. À minha amiga e a mim. Do seu entendi-mento, à priori, talvez tenha surgido não só um lapso anacrónico como conceptual, fruto quiçá da ligeireza com que devorou o texto que escrevi. Compreendo, portanto, esta situação. Sendo assim, e partindo do seu comentário – que em epígrafe reproduzo na ínte-gra – passo a registar de seguida o que me ocorre dizer-lhe. Primeiro que tudo refere a existência de um “quase” que lhe ficou atravessado. Pois claro, é a resultante da sua paralaxe anacrónica, em que incorreu. A minha amiga refere “poética modernista” (aquela em que nós fomos instruídos) logo, como é óbvio, caiu inadvertidamente em confusão. Eu, ao referir-me ao pós-modernismo em curso, quis tão só identificar e caracte-rizar o estado da literatura que tem proliferado nas últimas três/quatro décadas e, como deve saber, tem sido marcante uma permanente postura de afirmação libertária e, direi mesmo caótica – a mais que conhecida “paixão do caos” – afirmação essa que pode perfeitamente ser constatada nas mais variadas manifestações da actividade humana. Deste fenómeno resulta, como é fácil de observar em todos os locais de mercado livrei-ro, um autêntico maremoto abortivo de produções artísticas. Esta fenomenologia evolui normalmente apadrinhada pela chamada “ideologia de oportunidades”. E os resultados estão profusamente à vista. Talvez, por estranho que pareça, seja a Poesia a maior vítima desta aberração. As razões para este estado de coisas estão suficientemente descritas e destacadas no meu escrito. Todavia, concordo consigo na afirmação que faz de que há aqui e ali algo de qualidade nestas literaturas e, por conseguinte, nestas poéticas. Eu também gosto de ler muitas vezes – caldeando com os clássicos sempre à mão – a poesia deste nosso tempo. Mas terá de compreender que, por pressão dos mercados, os escritores e, obviamente os poetas, encontram-se por demais condicionados pelos interesses imediatos dos “merca-dores de Aladino” e, claro, como nesta vida que corre há sempre mais olhos que barriga, para eles o esforço é enorme, as ilusões são férteis e, quando acordam para a realidade, já “tudo o vento levou”. Neste contexto há-de reparar que eu referi, na explanação feita acerca desta de-sinserida proliferação literária, haver “raras excepções” como, aliás, é paradigma de toda a regra. Portanto, são estas mesmas excepções que os dois temos em comum, não concorda? Estimei que tenha referido que, apesar de reconhecer uma certa admiração pela “poética modernista” continua tendo, no fundo, uma praxis “conservadora” usando normalmente as formas mais tradicionais da poesia. Por razões concomitantes, como não praticamos o “maria-vai-com-as-outras” parece-me que, no que diz respeito às formas e metodologias poéticas, os dois navega-mos na mesma embarcação. Trata-se, em suma, de uma postura de «resistência» perante as vagas da poesia sem nome e sem carisma. Adenda oportuna. Resposta de Maria João. "Tem toda a razão, Frassino Machado. Houve, efectivamente, um lap-so meu, fruto da rapidez com que, como muito bem diz, "devorei" o seu artigo. E não, nenhum de nós "embarcou" no longo comboio do seguidismo e dos interesses de mercado! Verdadeira Resistência e amor às genuínas raízes isso é quando, pela genuinidade, estamos dispostos a dar tanto, meu caro Fras-sino! Grata pela sua atenção." Congratulo-me, estimada amiga, pela compreensão das minhas razões. Mas, longe de mim monopolizar essas mesmas razões... Sou suficientemente humilde (quali-dade revindicada por Jorge de Sena para todos os POETAS) para valorizar como su-prema a sua voluntariosa atitude. Bem-haja, Mª. João, pela manifesta cordialidade. Já agora, por falar em Jorge de Sena, quero dizer-lhe que – partindo da sua pro-posição “cresci rodeada de modernistas” – não poderei deixar de testemunhar a mesma constatação, no que diz respeito ao meu «crescimento/maturação», de que do mesmo modo sempre com-vivi com variadíssimos criadores modernistas da crista da onda. Entrei para a escola primária no ano da morte de Teixeira de Pascoaes. Este facto talvez tenha decidido em grande parte (pois, na altura, muito se falava nas escolas deste poeta) a minha paixão pela arte poética; tive como mestre literário, nos anos do secundário, o prestigiado poeta frei Adelino Pereira; como académico, em Lisboa, mar-cou-me toda a envolvência de um curso estival de 1977 do grande poeta Jorge de Sena que, qual meteoro de aparente circunstância, deixou na capital da república um trans-cendente raio de luz; e, mesmo na actualidade, não prescindo do acompanhamento de ensaístas e pensadores de renome (mesmo não sendo poetas… mas que percebem da poda), tais como Eduardo Lourenço, Maria Luísa Malato e Miguel Real. Para que conste. Um abraço cordial do poetAmigo sempre Frassino Machado In PARA ALÉM DA POESIA
FRASSINO MACHADO
Enviado por FRASSINO MACHADO em 22/11/2013
Alterado em 21/11/2023 |