A BURRA DA ARROCHELA
Tive há tempos uma burra,
Ora mansa, ora brava, Ensaiei-lhe forte surra Mas a burra não andava. Granjeei-a no mercado Para as minhas precisões Mas fui logo enganado Num negócio a feijões. Fui no conto do vigário, Numa falsa reinação, Minha vida ao contrário Só me traz desilusão. Foi lustrosa e refinada Na courela de um marquês E agora desempregada Já não tem nenhum freguês. Àquela infeliz burreca, Meia parda, meia verde, Emborquei-lhe uma bejeca E saltou-me p´ ra parede. Parecia uma jumenta Não sabia trabalhar Espargi-a de água benta Pôs-se logo a zurrar. Mui velhaca esta burrica Rejeitava comer palha Pelos vistos é bem rica E eu pobre, Deus me valha. Ia o tempo e a burranca Não fazia seu serviço Outro dia fez-se manca, Não há quem lhe dê sumiço? Não gostava da carroça E dava coices para o ar Castiguei-a numa choça E comida nem pensar. Tive pena desta mula Não sabia o que fazer Para lhe matar a gula Dei-lhe figos a comer. Quem souber da felizarda E lhe queira dar ousio Arreatem-lhe uma albarda Para um novo desafio. Se a pileca não engata Nunca trote lá na frente Pegue a burra p´ la arreata Vá a pé com toda a gente. Se tiver dificuldade Compre-lhe umas ferraduras Morrerá de velha idade Como as santas criaturas. Esta trova metafórica Não tem nada de política Tem pimenta e retórica E até alguma crítica. Eis a estória-brincadeira Desta Burra da Arrochela, De um lugar de Nespereira, Vivendo à boa-vai-ela! Frassino Machado In CANÇÃO DA TERRA E DO MEU PAÍS (*) (*) - 2.ª Versão original
FRASSINO MACHADO
Enviado por FRASSINO MACHADO em 16/11/2012
Alterado em 16/11/2020 |