CANTO DE FRASSINO

Os meus horizontes são de Vida e de Esperança !

Textos

BARAÇAL DO CÔA - O Magusto é Tradição
Crónica do Prof. Assis Machado

Um frio domingo de Outono, último de Outubro. Tarde amena e poucas pessoas aparentemente interessadas neste evento projectado para esta altura. Cartazes fixados nalguns lugares, havia-os. Na internet estava registada a correspondente notificação para quem de fora viesse, honra seja prestada à Associação Cultural e Desportiva deste povoado. Pairava no ar a espectativa quanto ao haver ou não gente na terra que justificasse a realização do evento. Que o colectivo faz mesmo jus que todos partilhem estas saudáveis e louváveis iniciativas.
Às catorze horas aprazadas para se iniciar o convívio não havia ainda viva alma no recinto da aldeia onde, por hábito, se celebram todos os encontros e convívios. Apenas uma ou outra pessoa curiosa olhava de longe a ver se algo acontecia. Mas não. Nada.
Por volta das quinze horas finalmente surge uma carrinha e logo após um pequeno grupo de pessoas, relativamente decididas e animadas. Ouviram-se alguns tímidos sons musicais vindos do bar do recinto, entretanto aberto, sinal de que algo ia acontecer por ali. E começou, de facto, aos poucos a aparecer gente, vinda dos diversos lugarejos da freguesia. Ouviram-se ruídos de ramos de lenha seca, e não só, e passados alguns minutos viram-se as primeiras labaredas da fogueira, para onde iam sendo lançadas paulatinamente algumas cestas de castanhas que haviam sido angariadas pelos conterrâneos mais voluntariosos. Estava dado o pontapé de saída para o magusto deste ano, hoje sob a síndroma da crise nacional instalada.  
Pouco passava das quatro e meia da tarde quando o recinto de festas da freguesia começou a dar sinal de grande animação. A música já estava suficientemente alteada e a criançada brincava por todo o lado, saltando à corda ou jogando a bola. Começou a ver-se gente adulta divertindo-se, uns falando animadamente por aqui e por ali, outros jogando as cartas debaixo dos vizinhos castanheiros, outros jogando a malha, na pista desportiva ao lado e, no bar, acendia-se um fósforo e lançavam-se com entusiasmo os ingredientes mais diversos num caldeirão caseiro, donde sairia mais tarde a prometida e desejada sopa à lavrador. Enfim, finalmente, a tarde compunha-se e toda a minha gente se entusiasmou..
A fogueira estava crepitando e, aos poucos, foram-se ouvindo castanhas a estalar por aqui e por ali. Enquanto os magustais davam voltas à lenha e remexiam as ditas, começaram a aproximar-se os mais curiosos tentando apanhar as primeiras castanhas que saltitavam fumegando. Por volta das cinco e pouco da tarde já quase toda a gente rodeava a fogueira e mastigava as castanhas que, entretanto, iam saindo. – Oh, Janela, olha ali aquelas daquele lado! Oh, Victor, mexe daí dessa banda! – Olha, ó Quim, remexe desse lado para ver se assam mais depressa. – É pá, faz muito fumo, é pena o folhedo estar um bocado húmido. Assim demoram mais tempo a assar! Todavia a assadura lá foi andando e as castanhas abundavam bem boas.
E, durante cerca de uma hora e tal, toda a gente – à volta daquela fogueira solidária – foi apanhando, soprando, descascando e mastigando o delicioso fruto dos castanheiros da terra. – Oh, Isabel, por onde anda a jeropiga? Está além, naquele garrafão, diz o Rui. - É uma delícia, retalha a Paula. - E, com estas castanhas, nem queiram saber, é mesmo a matar, acrescenta o Rui. E até as madames, embora com algum recato, foram as primeiras a saborearem a jeropiga. Os comentários não eram muitos, mas que se viam línguas a deslizar languidamente ao longo dos lábios, isso era uma evidência colossal. E, então, não é que daí a pouco cavalheiros e madames – maleitas, que as havia, havia, mas à parte – todos faziam corrupio à volta do garrafão da jeropiga!
E, enquanto se iam comendo castanhas e saboreando o referido néctar, dois fotógrafos de emergência iam tirando, ora de um lado, ora de outro, as costumeiras fotos para memória futura. É sempre desejável e salutar que, destes convívios agradáveis, possam prevalecer, na maior parte das pessoas, pequenas amostras para mais tarde recordar. – Há que ter matéria para meter no facebook, diz a Paula. – Ou para fazer uma crónica ilustrada, acrescentei eu!
- Oh pessoal, diz o Carlos, voltem-se para o telheiro. Vem ali a sopa p’ ra gente! E todos se dirigiram naquela direcção. Naquele espaço a um dos cantos do recinto havia, de facto, um telheiro que serve de palco para as festas anuais. Ali actuam artistas ou bandas populares que muita vida empresta ao povoado a quando das festas do padroeiro.
Uma mesa cheia de guloseimas: fatias de pão, alguns abastados queijos da vizinha Estrela, rodelas de enchidos apetitosos, algumas travessas repletas de bolos de diversa qualidade e feitio, muitas garrafas de sumos variados e, dois pipotes de vinho branco ou tinto, além da jeropiga que, como é óbvio, fazia a honra do dia. Esta a mesa que a Associação preparou para todos, em ambiente de sã familiaridade.
Ao lado, em cima de outra mesa mais pequena, fora já colocado o caldeirão com a ditosa sopa saloia, conhecida aqui por “sopa à lavrador”.  
Ali se colocaram o Carlos e o Zé, servindo a cada conviva uma malga daquela fumegante sopa, bem farta e cheirosa: legumes bem cozidos, feijão vermelho, cotovelinhos de massa, uns pedacinhos de cenoura disfarçada e até, ora vejam, pedacinhos de carne de porco entremeado, que lhe dava aquele gostinho campestre tão característico.
E todos, em fila, arrecadavam a sua malga, antes que se fizesse tarde. E, claro, o respectivo copo de tinto à maneira, que é como quem diz, uma vez não são vezes!
Esta sopa estava mesmo uma delícia. Alguém terá afirmado: - uma sopa como esta até ressuscitava o pobre do Lázaro! Por entre risos de concordância tácita, ouviam-se já por aqui e por ali, algumas vozes questionando se não havia lugar a segundar… por outro lado, a grande panela já se ia inclinando e era preciso assegurar que chegaria para todos, portanto, paciência…
Estava toda a gente no declinar da comezaina quando – eis milagre, a lembrar Caná – Eh, vem ali outra panela, gritou alguém! De facto, não uma panela, mas outro caldeirão de sopa, maior que o primeiro. – Ena pá, vamos lá segundar! Cheguem-se cá que esta ainda ficou melhor, diz o Rui! E, verdadeiramente, todos foram de novo encher a malga, aos caldeireiros de serviço. Todos comeram até ficarem saciados
Os bolos, por sua vez, tornaram-se em seguida uma saborosa atracção, nomeadamente para a pequenada que não teve mãos a medir. – Ah, os grandes comeram muita sopa, e nós pouco (?) pois não gostamos muito de sopa, diz uma miúda enfarruscada, como quase toda a outra miudagem!… - Agora, queremos os bolos para nós! – Olha a engraçadinha, diz a Izabel, quem não comeu sopa, agora também não come bolos! Claro, que era apenas uma graça para todo o pessoal rir…
A noite, entretanto, estava chegando e mais um magusto festivo terminou com toda a gente satisfeita, dando os parabéns aos dedicados organizadores de um tão lauto convívio, desejando que para o ano se repita este cordial evento.  

F I M
FRASSINO MACHADO
Enviado por FRASSINO MACHADO em 01/11/2011


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