04/07/2006 19h30
A TERTÚLIA DA COPA DO MUNDO
Excelsa tarde de 1 de Julho. Eram dezasseis horas em ponto. Todos os espíritos lusitanos – quer entre os mais novos, quer entre os mais velhos – estavam presos à germânica terra de Gelsenkirchen. Ali se iria travar uma das mais dramáticas batalhas futebolísticas de que há memória. Efectivamente, entre as hostes inglesas e o esquadrão luso, comandado pelo generalíssimo Scolari, o equilíbrio de forças era mais que evidente. A sorte estaria obviamente do lado de quem mais sangue frio patenteasse. Ora, naquela tarde, dois países pararam para ver com toda a atenção o desenrolar dos acontecimentos. Na Inglaterra onde, bem no íntimo, era esperada a desforra da eliminação do Euro transacto, bastante mal digerido pelos filhos de Sua Majestade, como tem sido de tradição. Em Portugal, onde a crença numa nova façanha era evidente sentia-se em toda a gente uma onda de energia patriótica. Este cenário, como se pode calcular, veio condicionar a realização de mais uma Tertúlia Poética. É que, pelo evoluir desta presente Copa do Mundo, talvez pouca gente no nosso país tenha equacionado a presença da nossa esquadra desportiva nos quartos de final. Daí que, à hora do começo do jogo na Alemanha, não se vislumbrava pelas ruas de Lisboa e, muito menos, nas proximidades do auditório da Gomes Pereira, viva alma. Toda a gente se recolhera a casa, ou às boxes ( como se diz em gíria desportiva ) para, na concentração e no silêncio da sua pessoa ou no sossego de um grupo de amigos, assistir ao desenrolar deste misterioso ritual. A hora e meia convencional daquele prélio não foi suficiente para que qualquer das equipas violasse sequer a área das balizas. Por altos e baixos, por vais e vens sucessivos dos contendores, por emocionantes nuanças e ritmos, na direcção quer de um como de outro lado, o tempo ditou a sua lei e o previsível prolongamento teria que acontecer. A equipa lusa, todavia, teve do seu lado uma vantagem inesperada. Quase metade deste referido tempo usufruiu, por força da expulsão de um dos seus elementos, de mais uma pedra no seu xadrez. Contudo, este facto nunca traduziu uma superioridade nítida da equipa das quinas perante a dos britânicos.
Entretanto, a hora de subir o pano da Tertúlia estava eminente. Iam chegando pouco a pouco algumas pessoas com actuação marcada e outras, por ironia do destino, já nem sequer tiveram força para saírem de casa. Decorria o nervosismo do prolongamento. Gastavam-se as vitaminas volitivas do quotidiano, o sol aproximava-se do fim do horizonte e ... nada. Foi preciso mudar estratégias, tácticas, disposições anímicas, atitudes e gestos corporais... para que não houvesse lugar ao entorpecimento da alma. E, no fim de tudo, a fatalidade das grandes penalidades. A tradição veio à tona da água e, com ela, a suspeição e o medo de falhar. Foi aqui que assentou arraiais o génio da lusitanidade. Tudo calmo, compenetrado e convicto da certeza de ganhar... do outro lado, o fantasma e a tremedeira dos bretões. Foi-se a Tertúlia, nos seus ditames, mas ficou para os lusos a conquista da façanha já sonhada. Frassino Machado Publicado por FRASSINO MACHADO em 04/07/2006 às 19h30
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